terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Jorge de Andrade

Biografia:
AOS 61, MORRE O DRAMATURGO JORGE ANDRADE
Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 14 de março de 1984
O autor de peças de teatro e de novelas de televisão Jorge Andrade morreu de edema pulmonar ontem de manhã, aos 61 anos, no Instituto do Coração, onde estava internado desde o dia 6. Depois do velório, realizado no Teatro Municipal, foi enterrado no Cemitério São Paulo.No teatro, seu maior êxito foi "A Moratória", na televisão ficou conhecido do grande público por "Os Ossos do Barão" e "O Grito". Há quatro meses Andrade recebeu uma ponte safena, que implantou após sofrer um infarto. Segundo seus familiares, vinha melhorando, até que teve de ser internado de novo, no começo deste mês. A atriz Miriam Mehler, presente ao velório, disse que a saúde de Andrade foi prejudicada pelos constantes problemas que ele enfrentou em seu trabalho na televisão.
Morre o dramaturgo de São Paulo
O dramaturgo e autor de telenovelas Jorge Andrade morreu ontem aos 61 anos, vítima de edema pulmonar, no Instituto do Coração, onde estava internado desde o último dia 6. Seu corpo foi velado no Teatro Municipal e sepultado no Cemitério São Paulo às 17h30.Há quatro meses Jorge Andrade foi submetido a uma cirurgia de implantação de ponte de safena por causa de um infarto. Segundo familiares, vinha se recuperando, mas começou a ter problemas respiratórios no começo do mês, sendo internado novamente no Instituto do Coração, onde faleceu às 08h10. Jorge deixa a viúva Helena Almeida Prado e os filhos Camila, Gonçalo e Blandina e inúmeras obras de grande importância para a literatura brasileira.Nos últimos anos, Jorge Andrade, segundo depoimentos de amigos que compareceram ao velório, vinha sendo injustiçado pela emissoras onde apresentava suas novelas. Para a atriz Miriam Mehler, Jorge foi maltratado porque as "pessoas não sabem lidar com seres humanos. Acredito até que o infarto que sofreu no ano passado foi provocado pelos problemas que teve com a novela 'Sabor de Mel', na Bandeirantes. Agora, não adiantam mais glórias, pois ele já se foi".Para o secretário municipal de Cultura, Gianfrancesco Guarnieri, "Jorge teve muitos dissabores na televisão, tanto que seu maior sonho era voltar a Barretos, sua cidade natal, e viver exclusivamente para o teatro". Foi ele quem sugeriu à família que o corpo do dramaturgo fosse velado no Teatro Municipal. Guarnieri disse dever muito de sua vida profissional ao autor de "Vereda da Salvação", pois as obras de Andrade, como "A Moratória" por exemplo, serviram de impulso para o autor de "Eles não Usam Black-Tie"."Os Adolescentes", "Ninho da Serpente" e "Os Ossos do Barão", foram os maiores sucessos de Jorge Andrade na televisão, além de "O Grito", que teve Glória Menezes no papel principal. O ator Kito Junqueira trabalhou nas duas primeiras e lembra que Jorge Andrade sempre foi uma "pessoa aberta à discussão, que exigia sempre o melhor em seu trabalho, mas foi muito magoado pelos medíocres da televisão". Kito acha que com a morte de Jorge o teatro ficará ainda mais carente, "pois não existe nada de novo à vista".Conhecido também como o eterno solidário às vítimas da repressão imposta pela ditadura, Jorge Andrade foi, na opinião do sociólogo Florestan Fernandes, o único dramaturgo que conseguiu captar a realidade brasileira em todos os níveis. Seu primeiro contato com ele na ocasião de uma reportagem que Jorge fazia para a revista "Realidade". Disse Florestan: "Como sociólogo é fácil desvendar o valor do seu trabalho, que retratava o drama do cotidiano. Ninguém melhor que Jorge Andrade para mostrar o paulista, a burguesia".O diretor do Departamento de Teatro da Secretaria Municipal de Cultura, Fernando Peixoto, não teve muito contato com Jorge Andrade. Em 1963, na época do Oficina, Peixoto estava procurando textos de autores brasileiros para substituir "Os Pequenos Burgueses" e pensou em Andrade. Só que jamais houve o casamento Jorge-Oficina. Para Peixoto, as obras de Jorge Andrade têm um aspecto singular, pois não são isoladas. Elas se interrelacionam, formando um ciclo.O primeiro encontro de Lauro César Muniz com o autor de "Milagre na Cela" foi por volta de 56, 57 quando Muniz ainda era iniciante. Lembra que Jorge apontou os erros dum ensaio que o jovem Muniz havia feito. Além disso, Lauro César e Consuelo de Castro foram, junto com Jorge, co-autores da peça "A Corrente", estrelada por Rosamaria Murtinho e Mauro Mendonça há dois anos.Renato Consorte e Antônio Petrim, também presentes ao velório, tinham encontros esporádicos com Jorge Andrade. Eles lembraram a importância de sua obra para a literatura brasileira. Consorte quase montou a peça "Rastro Atrás" e Petrim trabalhou na novela "Os Ossos do Barão". Para Petrim, "se com Jorge o teatro já estava capengando, sem ele..."


Como muitos outros intelectuais, Jorge Andrade teve sua produção afetada por problemas com a censura no fim dos anos 60 e na década de 70. "Vereda da Salvação", que foi encenada pela primeira vez em 1965, teve temporada curtíssima, pois os tempos não eram propícios a um texto que mostrava a miséria e os sofrimentos de um grupo de camponeses. "A Senhora na Boca do Lixo", uma sutil mas direta crítica aos abusos de autoridade, só pôde estrear em Portugal (em 1967) e uma adaptação de "Pedreira das Almas" para a TV também foi vetada. O principal problema ocorreu, entretanto, com "Milagre na Cela" de 1977, que versa sobre as relações entre uma freira presa e seu torturador, inspirada num fato verídico da época. Isso não impediu que Jorge Andrade continuasse a ser considerado como um dos autores mais importantes de seu tempo e a ter seus textos premiados por órgãos oficiais, como ocorreu com a peça "Rastro Atrás", premiada pelo Serviço Nacional de Teatro em 1966. Seu teatro nunca foi porém, classificado como político, talvez porque, para ele, o homem fosse mais importante que as ideologias.Mas a censura certamente contribuiu para que ficasse sem escrever para o teatro durante oito anos, época que coincidiu com o início de seu maior envolvimento com a TV, para a qual escreveu várias novelas nos últimos anos, e que considerava um veículo de expressão tão importante quanto o teatro.Ele, porém, já dividia, desde a década de 60, sua atuação como autor com outras atividades, como o magistério (foi professor do Ginásio Vocacional em sua cidade natal - Barretos - e em São Paulo e ensinou na USP a partir de 1967) e o jornalismo (em 1979 foi colaborador da "Folha", escrevendo vários artigos para a "Ilustrada"). Esta última atividade, em que brilhou como entrevistador participante, foi depois recuperada literalmente em seu romance autobiográfico "Labirinto". Nele se destaca a quanto a memória, sobretudo a memória afetiva, foi fundamental para a obra de criação de Jorge Andrade. Uma memória que recupera desde as suas lembranças de família (que também constituem o núcleo de "Rasto Atrás"), entre as quais se destaca a presença marcante da avó, Mariana - a mulher forte na resistência - até as relações de amizade, que vê sempre como uma riqueza que a ele se acrescenta.

Amor à terra marcou sua vida
Aluísio Jorge de Andrade Franco, mais conhecido como Jorge Andrade, nasceu a 21 de maio de 1922 em Barretos, descendente de uma família de fazendeiros de café originária do tronco dos Junqueira, do Sul de Minas. Fez seus estudos até o secundário em sua cidade natal e em Bebedouro e, em 1938, veio para São Paulo para cursar a Faculdade de Direito, que abandonou dois anos depois. Após tentativas também sem sequência de cursar uma escola de cadetes no Nordeste e de trabalhar num banco, ele passou os anos que se seguiram na Fazenda Coqueiros, de sua família, exercendo a função de fiscal de cafezal, o que lhe proporcionou um contato direto com os camponeses, com os quais partilhava o amor pela terra. A terra para Jorge Andrade sempre teve um valor sagrado e ele diria anos mais tarde que, por amor dela, alguns homens oprimem outros, enquanto que, por esse mesmo amor, outros aceitam ser dominados. Ele abordaria essas duas vertentes em suas peças.

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